Espectadores ativos em 'Irrefreável' } Elenize Dezgeniski |
Os protestos de junho de 2013 também despertaram o gigante da hibernação ágrafa. Um mar de reivindicações escritas em papeis sulfite e cartolina como que individualizaram a maneira de veicular as reivindicações que, ao cabo, dizem respeito à massa e cravam indignidade. Renata de Roel e Fernando Proença extraem desse ato público (de colocar a boca no trombone em letras garrafais ou cursivas) a sua dimensão íntima. “Irrefreável” faz da plateia o lugar inverso da representação. Cria um ambiente de afeto, antiespetacular. Os cartazes e as faixas que o ator e a bailarina trazem aos poucos para a beira do palco somam-se a outros papeis em branco nos quais o público é convidado a se expressar a bel-prazer. Canetas hidrográficas, corações recortados e o exercício de encontrar a melhor posição para escrever no chão e depois pendurar sua “arte” na cortina da sala deram – àqueles que se dispõem e àqueles que contemplam – uma passagem para as lembranças dos primeiros anos escolares, quando as noções de liberdade e independência começam a ser delineadas. A experiência dá ganas de o sujeito refutar a sujeição, uma boa premissa cidadã. A certa altura, uma faixa desfraldada traz os seguintes dizeres em espanhol, pinçados da prosa poética da multiartista estadunidense Patti Smith ao rememorar o amigo e fotógrafo Robert Marpplethorpe (1946-1989) no livro “The Coral Sea" (“O Mar de Coral”). Trata-se de uma frase introdutória em que a cantora comenta a resiliência do parceiro preservada nas memórias: “Pero, sobre todo, hablan de su férrea voluntad de vivir, que era irrefrenable, incluso en la muerte”. A cena de Fernando e Renata inscreve um convívio laboratorial provisório. Os códigos elementares surpreendem por não derivarem das laias reconhecíveis das artes cênicas, ainda que delas a bailarina e o ator sejam tributários, desfilam os teus “ais” na tensão do existir. (Valmir Santos)
Os cocriadores Renata Roel e Fernando de Proença } Elenize Dezgeniski |
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