A cena “Suba na vida” do grupo Casa de Passagem foi realizada na calçada em frente ao Teatro da Caixa. Parece que a cena, originalmente, não foi concebida para ser encenada num espaço externo, o que trouxe alguns problemas para quem estava assistindo. As três atrizes fizeram a cena como se só houvesse público à sua frente, quando havia gente assistindo de todos os lados, além das pessoas que transitavam pela rua naquele momento. Assim, a rua, um elemento que parecia ser relevante na cena, não foi incorporado. Não houve um enfrentamento com a espacialidade, embora a rua imprimisse na cena a sua própria dinâmica, além, é claro, da sua visualidade. Em determinado momento, parecia que todos os problemas que a rua trazia eram enfrentados na extroversão e no grito.
Um aspecto do grupo que pode ser apontado a partir dessa relação que se deu ali com uma rua que não estava prevista é o tipo de energia de que as atrizes lançam mão para dar conta do que precisam apresentar. Talvez seja um pouco cafona e fora de moda falar de “energia”. A questão mesmo seria a da presença, mas acho que a energia ou a força é algo anterior à ideia de presença, é a ferramenta que o ator usa pra chegar num determinado estado, efeito ou numa condição de possibilidade da cena. Apesar de enérgica, movimentada, chamativa, a qualidade do “estar em cena” do grupo ficou um pouco aquém da presença necessária pra dar conta de fazer uma cena na rua.
Procurando entender por que eu tive essa sensação, pensei que de alguma maneira a energia que as atrizes investiam na cena não tinha muito foco. Havia ali uma prontidão, uma urgência em fazer uma coisa depois da outra com agilidade, mas essa prontidão era mais agressiva, parecia estar mais relacionada com uma imposição da cena do que com uma disponibilidade para a cena. A (pelo menos aparente) pouca experiência do grupo na lida com a rua talvez seja um fator determinante. A amplitude do espaço demanda uma expansividade, mas a relação com o espectador demanda uma canalização da tal energia. Para fazer teatro na rua, acredito que a articulação destas duas demandas seja importante.
O final da cena, a apoteose das atrizes saindo com um carro premiado, foi muito preocupante e quase estragou a alegria do momento. Naquele clima de expansividade sem foco, na impetuosidade de vencer a rua no grito, pareceu um tanto irresponsável que uma das atrizes saísse com o carro, com outra atriz com a cabeça pra fora da janela, sem prestar atenção na rua em si, no movimento dos carros da “vida real”. Esse momento final entregou um pouco a estética da cena, que parecia ter um caos proposital: com esse deslize, ficou a sensação de que o caos também era provocado por um certo descuido.
Por Daniele Avila
Foto: Elenize Dezgeniski
Comentários
e antes que eu já entre chutando o pau da barraca me perguntando: "o que essa cena tem de performance?" irei por um outro caminha, muito ligada a crítica da cena apresentada em curitiba.
A cena não se define como performance, caminhando para um lado de não representação e de ações feitas no "aqui e agora"... ao mesmo tempo que não desvincula de todos os vícios do teatro... enfim, como foi dito simplesmente uma geleia geral!