Por Valmir Santos
A Pausa Companhia vai a Machado de Assis com causa. Põe em relevo uma crônica de 1895, na qual o escritor interpreta com sua pena um crime brutal, o assassinato de uma bebê pelos pais em terras gaúchas. Sob os códigos do niilismo, o autor questiona a humanidade e sua vocação atávica para gerar dramas como esse. Tudo, é claro, com seu estilo corrosivo e bem-humorado. E o núcleo artístico o reinterpreta neste 2011 em conformidade com procedimentos brechtianos, a narrativa épica que permite ao público distinguir diagnósticos e sintomas de seu tempo.
Autor de Si Mesmo adota um sistema despojado para a cena. Valoriza o plano das ideias sem empolá-las. Ao contrário, a retórica do narrador poderia soa pernóstica, porque este é encarnado machadianamente à maneira do filósofo Arthur Schopenhauer. No entanto, o raciocínio é ilustrado a contento.
Um retroprojetor exibe balõezinhos de historias em quadrinhos no enredo que retrocede ao namoro dos pais e ao bebê vaticinando seu futuro antes mesmo da barriga. A citação à obra-prima do pensador alemão, O Mundo Como Vontade e Representação, corrobora a estratégia dessa criação coletiva ao problematizar a cena sem abusar do didatismo.
Se a direção é articulada em muitos aspectos, falta ao conjunto dos intérpretes uma sofisticação correspondente no trabalho corporal, inclusive para adensar o timming físico do sarcasmo. De qualquer modo, a Pausa instiga o interlocutor sem abrir mão da inteligência, a mesma que pressupõe o arrojo de cohabitar as artes de Machado e Brecht. Não é pouco.
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